Lugar comum
Coisas bonitas que saem de visitas ao Lidl, passeios por estradas nacionais e consultórios médicos
As pequenas coisas é que contam.
Se existe maior clichê ou lugar comum, simplesmente não consegui pensar nele.
Às vezes passam pela minha timeline aqueles videos de inquéritos de rua em que se pergunta a transeuntes (sempre sonhei usar esta palavra, finamente!) qual é o segredo de uma relação duradoura. Uns dizem que é nunca ir para a cama zangados, outros que cada um deve manter o seu espaço - eu acho que são as pequenas coisas que fazemos um pelo outro.
As pequenas coisas são pepitas numa relação e vão, se bem utilizadas, enchendo o cofre do tesouro construído pelo outro. Muitas vezes andam à volta de comida e bebida: quando ele me traz duas garrafas de Kriek de Bruxelas ou quando eu vou especificamente ao Lidl para comprar duas caixas de cereais dos que ele gosta ou quando eu lhe pedi uma garrafa de vinho durante a pandemia e ele me entrou em casa com uma garrafeira em potência.
Também são feitas do cuidado que pomos na nossa comunicação: aquela mensagem todos os dias ao acordar, a nossa localização quando estamos longe um do outro, fotografias de outros gatos que vemos por aí. E são feitas dos lugares onde queremos sempre voltar: o passeio que nos leva pelas Azenhas do Mar e acaba invarialmente num almoço na Ericeira, os dias a dois num hotel no centro de Lisboa, a praia da Costa Vicentina onde decidimos assentar cadeiras e lancheiras todos os anos.
As pequenas coisas são também actos de serviço, mais ou menos voluntário, como quando eu lhe peço para tirar fotografias para ilustrar coisas que escrevo ou quando dividimos as tarefas - quem faz o jantar não tem de deitar os miúdos!
Às vezes, as pequenas coisas transformam-se em coisas monstruosas, como quando chorámos os dois naquele gabinete médico depois de ouvir a palavra cancro e todas as vezes em que, desde então, pensei que ia morrer (e foram muitas!). As pequenas coisas também se agigantam quando precisamos empurrar a vida para frente porque um de nós está bastante doente ou porque o trabalho obriga a ausências mas é fácil entender porque não desistimos: é porque sabemos que tudo (tudo!) é passageiro e já já nos espera mais um pequeno acto de amor.
Este texto foi escrito para responder a um desafio que partilho com algumas pessoas que admiro nesta internet, em que escrevemos sobre o mesmo tema todas as semanas. Esta semana escrevemos sobre lugares comuns:
a Carla n’A curva -
a Rita no Boas Intenções -
a Maria João n’A Gata Christie - Lugar comum
a Calita no Panados e arroz de tomate - Lugar comum
a Mariana no Gralha Dixit -
a Joana n’O blog azul turquesa - Lugar comum
a Helena nos Dois Dedos de Conversa - Lugar comum
Oh pá, não há coraçõezinhos que cheguem.